A Insurreição anarquista de 1918, no Rio de
Janeiro, foi um evento inspirado na Revolução Russa[1]. Seu objetivo principal era
a derrubada do governo central brasileiro e a instauração de uma sociedade
autogestionada baseada em organizações descentralizadas e sindicatos operários
nos moldes propostos peloanarcossindicalismo.
Os precedentes indiretos da Insurreição de 1918 remetem
primariamente a vinda dos primeiros escritos de Bakunin,Kropotkin e outros libertários europeus para o Brasil em fins do século XIX junto a imigrantes italianos e espanhóisque vinham da
Europa para servir de mão de obra barata nas fábricas e nas fazendas dos
empresários e latifundiários brasileiros.
Mais diretamente, a insurreição é consequência do alto
grau de organização do operariado brasileiro nas primeiras décadas do século XX principalmente na Capital Federal que a época
era o Rio de Janeiro e na cidade de São Paulo. Em 1917 por conta da articulação de diferentes
sindicatos e organizações anarquistas as indústrias de São Paulo são paralisadas
com a adesão massiva dos operários aquela que ficaria conhecida como a Grande
Greve Geral de 1917.
Paralelamente a gripe espanhola que se espalhou pelas
principais capitais do Brasil fazendo milhares de vítimas. Como conseqüência da Primeira Guerra Mundial o custo de vida elevado atingiu
principalmente as camadas mais pobres da população, levando a fome a milhares
de pessoas, e a fome resultando em saques a diversos armazéns.
No Rio de Janeiro a FORJ (Federação Operária do
Rio de Janeiro) iniciava uma grande campanha contra a carestia de vida
e se empenhava na reestruturação de diversos sindicatos. Ao mesmo, tempo apesar
de proibidos pela polícia, multiplicavam-se grandes reuniões operárias nas
quais oradores e pensadores engajados discursavam para centenas, por vezes,
milhares de pessoas.
A dura repressão à greve na fábrica de Tecidos Corcovado
foi duramente reprimida pela polícia em Maio,[2] e o desabamento do Hotel New York em
Julho com a morte de dezenas de trabalhadores acirrariam o embate entre
operários e anarquistas contra governantes e empresários.
No início de 1918, notícias esparsas sobre êxito
alcançado pela Revolução Russa se espalharam pelas principais capitais
brasileiras. Desconhecendo o caráter da revolução bolchevique, grupos anarquistas passaram a se organizar
também com a intenção de derrubar o governo central no Brasil.
Ainda no começo do ano é criada a Aliança Anarquista do
Rio de Janeiro cujo objetivo principal
é difundir o pensamento libertário entre os trabalhadores de diferentes
setores. Em 1 de Março é fundada a UGT (União Geral dos Trabalhadores) substituindo a FORJ[3][4] que em Agosto de 1917 havia sido fechada pelo
aparato repressivo estatal. Desde o seu surgimento a UGT também é alvo de
repressão da polícia que reage a boatos de uma suposta greve geral.
Em 1 de Maio de 1918 é decretado estado de sítio na cidade
do Rio de Janeiro, operários e anarquistas se organizam para a comemoração do Dia do Trabalhador nas sedes sindicais, em salões e mesmo num
teatro (Maison Moderne que à época existia na Praça Tiradentes) da cidade.
No mês de Agosto os operários da Companhia Cantareira e
da Viação Fluminense entram em greve por melhores salários e jornada laboral de
oito horas, paralisando tanto os transportes de barca Rio - Niterói como a
circulação dos bondes. Diante da greve os empresários acionam os aparatos
repressivos estatais que intentam acabar com a greve a força. Diante da
repressão os operários reagem fazendo com que a greve adquira caráter de
insurreição. Diante da violência policial um número considerável de soldados do 58º Batalhão de
Caçadores do Exército que entraram no conflito
pegando em armas ao lado dos trabalhadores.[3]
Planejamento
Nos meses de Setembro e Outubro continuariam os embates
entre operários e policiais nas ruas da capital Neste clima conspiradores se
reuniriam para elaborarem a Insurreição anarquista que seria finalmente marcada
para o dia 18 do mês seguinte. Seu objetivo era derrubar o Estado e
substituí-lo por uma rede de conselhos de trabalhadores.
Em reuniões secretas se encontravam intelectuais
engajados como o professor José Oiticica e sindicalistas como Manuel Campos, Astrogildo Pereira, Carlos Dias, Álvaro Palmeira, José Elias da Silva, João da Costa Pimenta e Agripino Nazaré.[5] E contavam com a suposta adesão de
setores de militares de baixa patente liderados pelo tenente Jorge Elias Ajuz que chegou a ficar responsável pela
estratégia militar do levante.
Os planos que envolveram diretamente mais de 400
operários e indiretamente milhares de outros, incluíam a tomada e o isolamento
do Palácio do Governo, o estabelecimento de uma greve geral relâmpago de
diversos setores operários, a implantação de 1.600 bombas para a sabotagem das
linhas de energia e transporte e a imobilização de possíveis focos de
resistência através da ocupação de delegacias e quartéis.
18 de Novembro
Na manhã do dia 18 de Novembro os operários da indústria
têxtil declararam greve simultânea nas fábricas de Niterói, Petrópolis, Magé, Santo Aleixo e Rio de Janeiro. Rapidamente aderem à greve
operários do setor metalúrgico e trabalhadores da construção civil. À tarde
cerca de 400 trabalhadores se reuniram no Campo de São Cristóvão,[6] diante da qual é mobilizado o aparato repressivo
estatal com objetivo de dispersá-la. Os trabalhadores reagem iniciando uma
verdadeira batalha. Duas bombas explodem em uma delegacia próxima e a multidão
a toma de assalto. Pouco depois soldados do Exército cercam o local desocupando
a delegacia e dispersando os trabalhadores que lá estavam. O conflito se
estende pelas ruas vizinhas com o exército tentando impedir a multidão cuja
intenção era ocupar a Intendência do Exército.
No entanto, ao ser colocada em andamento, a tentativa de
derrubada do poder é frustrada pelas autoridades que tinham conhecimento de
todos os planos, uma vez que o tenente Jorge Elias Ajuz que participara de
todas as reuniões e conhecia todos os planos, na verdade atuava como um espião e agente provocador.
Ao saberem que o levante havia sido traído, os operários
passam a evitar atitudes extremas abandonando os planos previamente definidos.
Após a tomada a Intendência, trabalhadores e militares revoltosos rumariam para
o centro e atacariam a Prefeitura, o Palácio da polícia e o quartel da brigada
policial. Na zona sul outro grupo de operários ocuparia o Palácio do Catete e a
Câmara de Deputados destituindo o presidente e demais políticos. Nada disso
aconteceu.
No inicio da tarde foram presos todos os principais
articuladores - José Oiticica, Manuel Campos, Astrogildo Pereira, Carlos Dias,
Álvaro Palmeira, José Elias da Silva, João da Costa Pimenta e Agripino Nazaré -
que nos dias que se seguiram foram deportados ou expulsos para outros estados
do país.
Foram detidos mais de 200 trabalhadores,[7] entre estes 78 diretamente vinculados
aos sindicatos anarquistas. Na porta da fábrica Confiança entrevero entre a
polícia e os revoltosos resultou na morte do sindicalista Manuel Martins da indústria textil e no ferimento de outro
operário que morreu dias depois. O cortejos fúnebres de ambos seriam proibidos
pela polícia, mas ainda assim aconteceriam acompanhados por centenas de
operários.
A greve de operários metalúrgicos, construtores civis e
da indústria textil duraria ainda mais duas semanas. No dia 20 a sede destes
sindicatos é fechada e a UGT é dissolvida por decreto federal.
Conseqüências
Em mais de um aspecto a insurreição foi um fracasso, não
produziu os efeitos revolucionários desejados. Ela, porém, obteve êxito em
evidenciar a falsa idéia transmitida pelo governo e pelos setores patronais de
que não existiam motivos para greves e que os operários estavam sendo tratados
com respeito e encontravam-se satisfeitos, por vezes trabalhando mais de 12
horas todos os dias nas mais deploráveis condições.
A insurreição seria ainda amplamente utilizada como
motivo para que Delfim Moreira, presidente em
exercício, perseguisse e acabasse com inúmeras organizações anarquistas, muitas
delas sem qualquer envolvimento com os ocorridos. O governo central ordenaria a
dissolução da União Geral dos Trabalhadores juntamente com o fechamento dos três
sindicatos ainda em greve. Até o fim da década inúmeras operações de repressão
seriam executadas e nem mesmo as escolas modernas em diversas capitais brasileiras seriam poupadas.
Por outro lado, graças à pressão popular resultada das
greves e da insurreição em 20 de novembro de 1918 é aprovada no Senado Federal uma lei que
define que o "trabalho seja regulado por leis que lhes dêem garantias
necessárias, garantias à sociedade, garantias aos patrões, garantias aos
operários".
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