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terça-feira, 19 de março de 2013

Anarco Sindicalismo no Brasil


No Brasil, tal como em muitos outros países, existe uma longa história de luta social que antecede o nascimento do capitalismo e a conseqüente formação da classe operária, a criadora da prática organizativa que conhecemos por sindicalismo.
No passado outras classes, grupos sociais e étnicos mantiveram uma luta de resistência contra a exploração e a dominação a que estavam sujeitos. Nessas lutas já estava presente o problema da autonomia e das estratégias a opor as classes dominantes, apesar de que só o mundo moderno viria a desenvolver uma cultura onde indivíduos e classes são reconhecidos como principais atores sociais.
Se for certo que algumas dessas contradições e conflitos sociais já se manifestavam na época pré-moderma, na América foi a chegada do homem branco, com sua cultura e instituições trazidas da Europa, que introduziu formas de organização econômica e social, que iriam gerar os crescentes conflitos sociais e de classes que se foram agravando na transição do capitalismo mercantil para o capitalismo industrial.
A chegada dos portugueses ao Brasil, abriu entre nós esse ciclo de formação de uma economia colonial ao serviço das metrópoles mercantis, seja de Portugal, de Espanha ou mais tarde da Inglaterra. Uma economia baseada inicialmente no escambo, mas logo organizada em torno dos latifúndios do açúcar e do café, que se somaria à exploração mineral de ouro e diamantes. Uma produção calçada na mão de obra escrava, índia e negra, dando a essa dominação e exploração, também um caráter étnico.
A industrialização brasileira ocorreria de forma lenta e precária, quer pela situação periférica do país, quer pela absoluta sujeição da sua economia aos interesses exteriores. As poucas oficinas e manufaturas existentes não chegavam sequer a suprir as necessidades do pequeno mercado interno, vindo a quase totalidade dos produtos da metrópole.
Esta situação só começou a sofrer as primeiras alterações com a vinda do rei D. João VI para o Rio de Janeiro em 1808, acompanhado de uma parte substancial da nobreza e burocracia portuguesas, em fuga dos exércitos napoleônicos que haviam invadido Portugal. A presença desta elite nobre impunha a criação de toda uma estrutura administrativa, comercial e produtiva capaz de satisfazer, pelo menos em parte, suas necessidades.
Multiplicaram-se, então, as oficinas e manufaturas, desenvolveu-se o comércio, surgindo a própria imprensa, que teria um importante papel na difusão primeiro das idéias liberais e, mais tarde, socialistas. No entanto, essas transformações não chegaram a criar uma dinâmica econômica mais vasta que apontasse a auto-suficiência, já que o Brasil, tal como Portugal, estava sujeito às imposições imperiais Inglesas que barravam o desenvolvimento comercial e industrial autônomo.
No século XIX, o Brasil viu nascer às primeiras indústrias metalúrgicas e manufatureiras, como a fabrica de ferro de Sorocaba (1801), a fabrica de armas de Minas (1811), a indústria Mauá, em Niterói (1845). Em 1850 havia já cerca de 50 indústrias, entre fábricas de tecidos, alimentação, metalurgia e produtos químicos.
Esta vagarosa industrialização estendeu-se por todo o século XIX e só se começou a acelerar já nas primeiras décadas do nosso século. A independência política do Brasil em 1822, o fim do tráfico de escravos em 1850, e abolição da escravatura em 1888, junto com a acumulação gerada pela cafeicultura iriam possibilitar a lenta e gradual modernização da sociedade brasileira, que transformaria a sociedade rural e escravocrata em uma sociedade urbana industrial.
É neste processo que se vai formando a classe operária brasileira, que nasce associada à libertação dos escravos que constituíam já uma parte da mão-de-obra dos estabelecimentos comerciais e das manufaturas, a que se somaram milhões de imigrantes europeus, na sua maioria italianos, espanhóis e portugueses, além de contingentes menores de alemães, russos, suíços e de outras nacionalidades.
Esses imigrantes teriam uma importância determinante na introdução das idéias socialistas no Brasil e na criação das primeiras associações de classe, já que muitos deles eram experimentados militantes que tinham participado da agitação social em seus países de origem e aqui chegavam fugindo da perseguição política ou da miséria que na Europa ameaçavam os trabalhadores, principalmente aqueles que tivessem participação ativa nas lutas sociais.
Qualquer análise do movimento operário entre 1890 e 1935 terá de concluir que em condições particularmente difíceis, de violenta repressão e com uma classe operária numericamente fraca e inexperiente, conseguiram os trabalhadores anarco-sindicalistas criar e desenvolver as organizações de resistência; travar duras lutas pata impor direitos básicos como a liberdade de expressão e organização dos trabalhadores, conseguindo vitórias expressivas no campo econômico, como aumentos salariais, redução do horário de trabalho, maior segurança, limitação do trabalho infantil, etc. Lutas que se estenderam à carestia de vida, aumento de aluguéis, falsificação dos gêneros alimentícios, contra o trabalho infantil, a favor de salários iguais para homens e mulheres e pela construção de creches. Estas lutas custaram a muitos desses trabalhadores a prisão, deportação e, até, a morte. Este sindicalismo revolucionário, que se pautava pela auto-organização e autonomia, aplicou uma estratégia de ação direta coletiva, impedindo a constituição de burocracias sindicais e a sujeição das lutas operárias a qualquer interesse exterior aos trabalhadores.
Os sindicatos anarco-sindicalistas desenvolveram também a propaganda anti-militarista e a favor da paz, promoveram escolas livres nos sindicatos, organizaram debates sistemáticos sobre temas como livre-pensamento, esperanto, alimentação vegetariana, combate ao alcoolismo, a situação da mulher, além de outros sobre temas científicos e literários. Realizaram festivais de solidariedade e representações de teatro social, criaram centros de cultura , onde os trabalhadores podiam confraternizar e se cultivar. Envolveram-se em campanhas internacionais de solidariedade com a Revolução Mexicana, Russa e Espanhola, contra o assassinato de Ferrer e de Sacco e Vanzetti, entre muitas outras demonstrações de solidariedade e internacionalismo.
O sindicalismo brasileiro desta época foi a materialização mais expressiva na nossa sociedade da criação duma prática autônoma pelos trabalhadores, e de construção duma cultura social alternativa no mundo operário, que afirmava acima de tudo os valores que faziam os trabalhadores se contrapor ao capitalismo: a liberdade, a igualdade e a solidariedade fundamentais para um socialismo que se queria libertário.
Apesar disso o anarco-sindicalismo também expressou limitações, umas resultantes das condições econômicas e sociais do Brasil na época; outras da sua incapacidade de contornar as dificuldades de penetrar nas regiões interiores do pais, influenciar o campesinato e compreender algumas das especificidades da sociedade brasileira, entre os as quais o fator étnico que sujeitava os trabalhadores negros a uma maior exploração e dominação. Mas a mais expressiva fraqueza desse movimento no Brasil - embora compreensível pelo tamanho do pais e a conseqüente dificuldade de comunicação -, ao contrário do que ocorreu em outros países, foi a impossibilidade de manter de forma acontinua uma associação e coordenação confederal, que potencializasse a força coletiva do movimento sindical brasileiro.
Poderíamos, no entanto, dizer sobre a derrota nos anos 30 do anarco-sindicalismo que ele falhou muito mais pelos desejos das classes dominantes do que por sua falta de projeto social organizativo.



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